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Contos & Histórias

Wladimir Novaes Martinez

Escritor 
Jornalista
Membro da OAB - Presidente da Comissão de Direito Previdenciário 
Membro da IBDPI
Membro do CEV

previdenciasocial@uol.com.br

VIAGEM CÓSMICA

No programa de preparação para a arrojada viagem espacial, durante dois anos fora construída a imensa espaçonave, cuja principal característica era ser completamente auto-sustentável. Os 120 cosmonautas escolhidos a dedo seriam transportados por dez anos até o destino, a uma velocidade fotônica.

 

         O empreendimento custara trilhões; valera a pena, a humanidade poderia viver em melhores condições dali a frente, se conseguisse executar os primeiros gestos de colonização de um exoplaneta especial.

 

         Os cosmonautas eram brancos, casados, vegetarianos, não fumantes e só bebem socialmente. Torcem para o mesmo clube e professam a mesma religião e partido político. Saudabilíssimos, todos são iguais para não ter problemas futuros. Estão de bem com a vida e sabem dos riscos que enfrentarão com aquela aventura

 

         O comando é ditatorial, chefiado por Irving Boulangger. Ele punirá quem cometer um ilícito grave que ponha em risco operação de voo imenso espacial.

        

Logo depois de decolarem e atingirem a velocidade necessária para deixar o sistema solar, sobreveio um descontrole no equipamento propulsor. A nave se afastava inexoravelmente em movimento retilíneo e uniforme numa direção não programada, sem parar.

 

Avançando no cosmo ficou fora de qualquer influência gravitacional.

 

         Ali na espaçonave existe de tudo o que é necessário para todos. A despeito de possuírem filmes, espetáculos e músicas e todo tipo de entretenimento, ela não consome um erg de energia, movida pela inércia. Quiçá expansão do universo,

 

Irving Boulangger convocou todos os cosmonautas. Esse tipo de chamada não era comum. Alguma coisa sucedera e deveria ser muito séria. Ullianov Bronstein, o físico teórico russo assistiria a reunião, um homem sisudo, ateu convicto, e de pouco falar.

 

--- Temos um enorme problema. Perdemos o controle total; esta nave está à deriva, não podemos fazer absolutamente nada.

 

Seguiu-se um pequeno tumulto; ele esperou os ânimos exaltados se acalmarem e passou a palavra ao russo.

 

--- Totalmente desgovernados, como vocês sabem, não consumimos energia para nos locomovermos, apenas para uso interno. Não se preocupem, somos auto-suficientes em todos os sentidos. Nada nos atingirá, exceto não chegarmos ao nosso destino antes desejado.

 

--- Para onde estamos indo? Indagaram.

 

Ao nada, fora a resposta. Sabiam da inexistência de qualquer corpo celeste nas imediações; somente a astronave em sua trajetória silenciosa, pacífica e infindável.

 

Irving retomou a palavra.

 

--- Se olharmos para trás constataremos uma escuridão total, como viajamos com velocidade de cruzeiro de 110% da luz, nenhuma imagem pode ser alcançada. Nem um pingo de luz. Estamos sós e nossas crenças.

 

O ministro religioso foi chamado, estava estupefato com o ocorrido; os fieis quedavam-se literalmente nas mãos de Deus, o pastor não subtraía sua evidente insegurança.

 

--- O que podemos esperar? Ele ouviu falar.

 

--- Olha, estou tão perdido como todos vocês. Durante toda a minha clerical vida estudei teologia. Para meu conforto pessoal formulei uma ideia de que Deus vela por nós. Tive uma conversa como Prof. Bronstein e descobri que esse ateu, agora, parece estar tentando mudar de ideia. Está com medo, não é de morrer, já tem idade. Me convenci de que sem ajuda externa nada poderá ser feito. Estamos condenados e só nos resta saber o que Ele nos reservou. Não sei o que pensar nem como confortá-los...

 

A nave rompia o espaço em mutismo absoluto, parecia estacionada, a frente não se via nada. A maioria convicta de que não serviria orar.

 

Irving era o único que passava horas e dias a frente da tela do bólido, sem enxergar coisa alguma, ele perdera a esperança de que algo sucedesse. Não tinha comunicação com o resto da criação. Sabia ser impossível qualquer operação externa. A nave fora projetada para ser auto-sustentável por 100 anos ou mais. Era absolutamente inimaginável determinar a qual distância estavam da Terra, talvez alguns trilhões de anos-luz.

 

         Tinha chamado Ullianov Bronstein para um bate-papo.

 

         --- O que você acha?

 

         --- Não acho nada, perdi as referências. Temos todo o tempo do mundo ao nosso dispor. Se pensam que posso ajudar de algum modo, estão enganados.

 

         --- Tem ideia de onde estamos?

 

         --- Penso que deixamos o espaço em que há matéria há algum tempo. Há muito não vemos conglomerados, galáxias, quasares, quarqs, buracos negros, estrelas, tudo ficou para trás. Navegamos na periferia do espaço e são poucas as leis da física que vigem neste sepulcro. De nada nos serve o nosso conhecimento newtoniano ou einsteniano. Voltamos a estaca zero. Perdemos a conexão com a existência.

 

         Boulangerr nunca vira Bronstein humilhado, esmagado e inseguro, sem perspectivas. Concordava, estavam destinados e viver até cada um morrer, sem entender o acontecido e ter a quem apelar.

 

         Ficou feliz de encontrar uma mocinha a quem solicitara que ficasse de olho na tela de observação. Ela não tirava os olhos um segundo da escuridão projetada no brilhante painel.

 

         Ficou pensando na sua Tucunduva, na Terra, onde nascera e a vidinha que com os seus amigos levavam, a professorinha Izildinha  e o jogo de pião, nas pescarias, lambaris no ribeirão dos porcos.

 

O que falar do escabeche que sua mãe querida fazia com os peixinhos que ali pescava. Ah! Se pudesse voltar no tempo... e desanimou não fosse a chegada de Evellyn; ela o tinha convidado para jantar com ela.

 

         Admirava a bióloga, ela fora capaz de projetar um sistema de reciclagem da água em que se perdia apenas 2% do precioso líquido a cada dez anos.

 

         Chamou a atenciosa garota para ficar no seu lugar.

 

         Evellyn conseguira obter temperatura ideal daquele vinho tinto francês, fizera um rigatoni ao sugo com batatas e criava um bom ambiente entre os dois.

 

As perspectivas pessoais eram tranquilas e, aí, o notável intercomunicador interno tilintou. Era a mocinha; ele estava sendo chamado ao comando.

 

         --- Comandante, observe a frente, um pingo de luz.

 

         Um ponto insignificante na tela, mal se entrevia. Imediatamente convocou Bronstein. Aquilo desmentia a versão de não havia um átomo num raio de alguns trilhões de anos-luz.

 

         A luzinha crescia, uma vez que a astronave caminhava na sua direção.

 

         --- O que você acha?

 

         Bronstein garantiu ser um objeto celeste com luz, um satélite, um planeta, uma estrela, uma galáxia, não podia adivinhar.

 

         Daí para frente, dias e dias, uma multidão se postava na cabine vendo aquele ponto luminoso lentamente crescer na tela.

 

         --- Meu Deus! Urrou o ateu Bronstein, é uma galáxia!

 

         Cedendo-lhe o telescópio, Irving acresceu na hora:

 

--- Não; é uma estrela de 5ª grandeza, note, girando em torno dela tem planetas.

 

         A menina firmou entendimento: são sete planetas. Usando alcance máximo do telescópio, bastante excitada, ela afirmou:

 

--- Foquei no terceiro planeta mais próximo da estrela, uma esfera azul, tem oceanos de água.

 

Sob um mutismo absoluto todos olhavam a imagem presas de um êxtase inexplicável. Os sinais astrofísicos informavam haver  atmosfera, temperatura média de 22 graus, ventos, chuvas, correntes marítimas e terra à vista.

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